Nossa infância molda não apenas memórias, mas frequências. Ainda que não tenhamos consciência, muitas das formas como reagimos ao mundo hoje foram aprendidas nos primeiros anos de vida. Mesmo com pouca convivência, a figura de um pai representa estrutura, origem, identidade. E quando essa base desaparece do plano físico, algo dentro de nós é chamado a se reorganizar. A dor, muitas vezes, não é pela ausência dele hoje, mas pela reativação do que ele representava lá atrás.
Com a morte de alguém importante, nossa atenção se volta inevitavelmente ao passado. Revemos fotos, lembranças, frases, padrões familiares. Falamos com parentes distantes, ouvimos histórias antigas. E ao fazer isso, reativamos camadas de vibração emocional que estavam adormecidas. Algumas são doces, mas outras são densas, incompreendidas, e nos tiram do eixo. O sentimento de estar “fora do lugar” não é apenas luto — é um descompasso entre quem somos hoje e quem fomos naquela base emocional antiga.
Mas há um caminho de volta ao equilíbrio. Ele não exige que você apague a dor, nem que a entenda completamente. Exige apenas que você escolha, a cada dia, um pensamento que traga um pouco mais de alívio. Pode começar assim: “Nosso relacionamento foi o que foi. Não foi ruim, nem bom, apenas o que pôde ser.” Isso não nega a dor, mas também não a alimenta. É um ponto de partida para voltar a si.
Talvez você deseje que tivesse sido diferente. Mais próximos, mais afetuosos, mais abertos. Mas não podemos mudar o que passou — podemos apenas escolher como nos sentimos ao lembrar. E quando você para de remar contra o que não pode controlar, seu barco emocional começa a virar, suavemente, para a corrente da vida.
Não se culpe por não ter dito o que gostaria. Nem por não ter sentido o que achava que deveria. Seu pai teve a vida dele, você teve a sua. Ambos seguiram como puderam, e está tudo certo. Você não veio para viver por ele, nem ele por você. Vocês apenas se encontraram num ponto do tempo, com as condições possíveis para aquele momento.
Agora é hora de honrar não apenas a memória dele, mas a sua própria expansão. A vida continua. E você pode usá-la para cultivar tudo aquilo que queria ter vivido — não com arrependimento, mas com intenção. Pode dizer: “Hoje, eu crio o tipo de vínculo que eu gostaria de ter tido. Hoje, eu cuido de mim como gostaria de ter sido cuidada.” Isso é libertador.
Seu equilíbrio não depende do passado. Ele depende da forma como você escolhe pensar o presente. E quando você se permite olhar para sua história com mais gentileza, algo muda por dentro. A rigidez cede, o julgamento amolece, e a vida volta a fluir. As lembranças ganham outro tom, e a ausência dá lugar à aceitação.
Você pode, sim, chegar ao ponto de lembrar com doçura. Não porque tudo foi perfeito, mas porque você decidiu se reconectar com a parte mais elevada de si. Essa parte que entende, acolhe e transforma. A saudade não vai embora — mas pode se transformar em gratidão, em amor silencioso, em uma presença leve. E é isso que você merece sentir. A paz de estar inteira de novo.
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